Com profissionais que permanecem há décadas na equipe, empresa paranaense mostra que retenção gera valor
A falta de profissionais qualificados tem se tornado um dos principais gargalos da construção civil brasileira. Segundo levantamento da Fundação Getulio Vargas (FGV), divulgado em março de 2025, 82% das empresas do setor relatam dificuldades para contratar, especialmente em funções técnicas e especializadas. O impacto recai diretamente sobre os custos e prazos das obras.
A escassez atinge especialmente áreas como montagem de estruturas metálicas, instalações elétricas e hidráulicas. Segundo a FGV IBRE, 70% das empresas desses setores afirmam não encontrar trabalhadores disponíveis para essas funções. A inflação da construção também tem sido pressionada pela falta de profissionais: o Índice Nacional da Construção Civil (INCC-DI) acumulou alta de 7,32% nos 12 meses até março de 2025, praticamente o dobro do índice registrado no mesmo mês do ano anterior. O maior impacto veio justamente da mão de obra, com alta de 9,5%, superando o aumento dos materiais, que ficou em 5,9%.
Para a Câmara Brasileira da Indústria da Construção (CBIC), o país precisa qualificar cerca de 350 mil trabalhadores ainda neste ano para atender à demanda do setor. Enquanto isso, muitas empresas adotam estratégias emergenciais como remanejamento de equipes entre obras, treinamentos acelerados ou reajustes salariais pontuais para tentar reter quadros.
Nesse cenário desafiador, algumas empresas têm adotado uma abordagem mais estruturada e de longo prazo. A Orpec Engenharia, com sede em Curitiba, que completou 60 anos em 2025, é um exemplo. Especializada em escoramentos metálicos, estruturas tubulares e locação de andaimes, a companhia carrega em sua história pessoas que sustentam a operação há décadas.
É o caso de Arildo Rogério Morais, que trabalhou diretamente com o fundador. "Participei do desenvolvimento de muitos equipamentos", conta Arildo, que entrou na empresa em 1992 e atuou em obras e eventos como os Jogos Mundiais da Natureza. "Nos anos 1990, os próprios funcionários produziam e faziam as montagens. Não tinha equipe separada. Era tudo junto", afirma.
Experiência que molda a cultura
Essa cultura colaborativa foi forjada em uma época com poucos recursos, mas se manteve mesmo com a modernização da estrutura. "Antes era tudo no braço. Hoje temos empilhadeiras, caminhões e outros equipamentos que nos ajudam a produzir mais e melhor", diz José Carlos de Peder, que começou como ajudante de pátio em 1994 e passou a operador de máquina. Segundo ele, o ambiente de trabalho também evoluiu. "Um ajuda o outro. Isso deixa o trabalho mais leve."
Essa sensação de pertencimento é um dos diferenciais destacados por quem permanece. No setor técnico, Wilson Duarte Ferreira da Silva considera a organização dos processos como base para o crescimento da equipe. "Hoje temos ferramentas de cálculo, segmentação por tipo de obra, tudo para dar mais agilidade e segurança. Comecei aqui há 12 anos e vi como a área se transformou."
A aposta na formação não se limita ao conhecimento técnico. Em 1995, quando Amilton Santos de Lima entrou na Orpec como auxiliar de serviços gerais, ele e um colega tinham apenas o ensino primário. "A empresa dava vale-lanche para a gente estudar à noite. Consegui completar os estudos."
Uma vantagem difícil de copiar
Esses relatos ajudam a entender por que a Orpec vai na contramão de um mercado marcado por alta rotatividade. Empresas que conseguem manter talentos por décadas acumulam uma vantagem difícil de copiar: know-how, estabilidade e confiança interna. No caso da Orpec, a experiência dos profissionais veteranos é parte do ativo da empresa. "A gente cresceu junto com a empresa. E ela também mudou com a gente", resume José Carlos.
Para Julio Mouro, diretor de operações da Orpec, a longevidade dos vínculos não acontece por acaso. “As pessoas ficam porque se sentem parte do que constroem. Criamos um ambiente onde a experiência é valorizada e transmitida. Isso faz diferença no resultado final das obras”, conclui.
Em tempos de escassez de mão de obra, reter talentos vale ouro na construção civil
PorPaulo Melo
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